O texto antigo, a Revelação Secreta de João, é um daqueles escritos encontrados na coleção de Nag Hammadi em 1945, e os estudiosos só agora estão lidando com a profundidade e o escopo dessa escrita notável.
O tema que quero abordar hoje é a personagem Sophia. De certa forma, acho que o livro deveria ser nomeado para ela porque ela desempenha um papel maior do que John ou qualquer outra pessoa. Mas seu papel também é bastante enigmático. Poderíamos até dizer, trágico. Ou, quem sabe, curar. Vamos ver o que você acha.
Quem ou o que é Sophia?
Os leitores do segundo século do texto (ou aqueles a quem ele foi lido) estariam familiarizados com Sophia a partir de sua longa história nas escrituras hebraicas e referências frequentes a ela entre o povo de Cristo também. Para ser claro, sophia é uma palavra grega geralmente traduzida em inglês como “sabedoria”. Pelo menos de alguma forma, Sophia pode ser conhecida desde os escritos da Sabedoria Hebraica, onde a “sabedoria” (chokmah em hebraico) aparece em Provérbios em um contexto personificado. “Senhora Sabedoria”, como às vezes era conhecida, não é realmente um atributo divino de Deus ou uma deusa distinta por si só, mesmo que ela pareça assumir a função de Deus ou expressar o envolvimento ativo de Deus no mundo.
A sabedoria é tão valorizada na Revelação Secreta de João, que ela faz parte da ordem original da criação divina estabelecida com o propósito de glorificar o Espírito invisível. Esta imagem de Sophia (Sabedoria) se encaixa com os escritos judaicos mostrando que a personificada Sophia estava presente quando Deus criou o mundo, e que ela é capaz de assegurar à humanidade a existência contínua dessa ordem.
Mas, o que aconteceu?! Na Revelação Secreta de João, ela faz a coisa mais imprudente que se possa imaginar! Ela contradiz a vontade do Espírito Infinito e quer gerar uma prole sem a consideração de seu parceiro masculino. Este ato é contrário à ordem da criação, onde macho e fêmea concordam sobre a ideia de criação juntos.
Não por acaso, sua prole é uma criatura grotesca que acaba criando estragos e angústias para toda a humanidade. Talvez possamos entender que o mal veio ao mundo por desobediência intencional, arrogância ou ignorância, mas a partir da Sabedoria?
Falta de sabedoria por parte de Sabedoria/Sophia?
A palavra parece perder o sentido, mas, mesmo assim, Sophia (Sabedoria) continua sendo uma personagem-chave na história da Revelação Secreta de João. Quem é ela?
No Novo Testamento, a relação de Sophia com Jesus flutua. Às vezes, Jesus aparece como se fosse o filho e profeta final de Sophia. Em outras passagens, Sophia é a fonte primária da revelação e sabedoria de Jesus. De fato, no Evangelho de Mateus, Jesus é apresentado como a própria Sabedoria.
Na Revelação Secreta de João, Sofia expressa o envolvimento ativo de Deus no mundo; como consorte do Espírito Infinito, ela é como uma noiva ou esposa; ela atua como agente tanto na criação quanto na reconciliação; e ela renova todas as coisas; ela estava presente quando Deus criou a ordem do mundo, por isso ela é capaz de tranquilizar a humanidade da existência contínua dessa ordem.
A Sabedoria é imprudente? A Sabedoria é sábia? Estudiosos têm ponderado sobre esse enigma desde que Sophia foi descoberta em histórias semelhantes em outros textos de Nag Hammadi.
Eis a minha conclusão, em poucas palavras. E devo deixar claro que só estou falando de Sophia na Revelação Secreta de João aqui. A história de Sophia aparece de forma um pouco diferente em outros textos.
Pela forma como Sophia é apresentada, acho que só Sophia (aquela que é sábia) poderia resolver o maior problema que assola o mundo. “De onde veio o mal?” Partindo do lugar da ordem divina, Sophia ilustra o significado e os meios pelos quais o mal opera para que as pessoas possam encontrar a sabedoria para resistir a ele. Não é exagero entender essa possibilidade quando consideramos o exemplo de Jesus
que, embora estivesse na forma de Deus, não considerava a igualdade com Deus como algo a ser explorado, mas se esvaziava, tomando a forma de escravo, nascendo à semelhança humana. E sendo encontrado em forma humana, humilhou-se e tornou-se obediente até a morte – até a morte em uma cruz. (Fp 2:6-8)
Sophia, uma salvadora
Sophia, que muitas vezes foi igualada e comparada a Jesus, assume o papel de salvadora emulando a condição humana e mostrando a saída. A sabedoria está idealmente preparada para salvar a humanidade de seus caminhos pecaminosos precisamente porque ela é sábia o suficiente e experiente o suficiente para entender todos os caminhos tentadores do diabo.
Sophia humildemente se arrepende e nos mostra como também nós devemos deixar de nos identificar com a criação inferior. Ela nos lembra que somos originalmente a “imagem e semelhança de Deus” – como prometido em Gênesis 1. Ela sabe, porque estava presente quando Deus criou o mundo.
Na Revelação Secreta de João, aprendemos sobre uma Sofia salvadora que nos ensina o envolvimento ativo de Deus no mundo e assegura à humanidade a existência contínua da ordem de Deus.