O que é Molinismo e é bíblico?

O Molinismo, nomeado em referência ao jesuíta do século XVI, Luis de Molina, é um sistema de pensamento que busca conciliar a soberania de Deus com o livre-arbítrio do homem. No cerne dessa perspectiva está o princípio de que Deus é absolutamente soberano enquanto o homem é livre, em um sentido libertário, para tomar suas próprias decisões. Dessa forma, o Molinismo procura evitar o “determinismo teológico”, que afirma que Deus decreta de maneira absoluta quem será salvo ou condenado, sem levar em conta a livre escolha do indivíduo. Atualmente, figuras como William Lane Craig e Alvin Plantinga são alguns dos seus principais defensores.

A principal característica do Molinismo é a afirmação de que Deus possui conhecimento intermediário (scientia media). Segundo essa visão, o conhecimento de Deus se organiza em quatro momentos lógicos—não cronológicos—onde cada momento é logicamente anterior ao seguinte:

  1. Conhecimento Natural – É o conhecimento de Deus sobre todas as verdades necessárias e possíveis, abrangendo tudo o que “pode ser”. Nesse aspecto, Deus conhece todas as potenciais combinações de causa e efeito, bem como todas as verdades lógicas e morais, independentemente de Sua vontade.
  2. Conhecimento Intermediário – Trata-se do conhecimento de Deus sobre o que qualquer criatura livre escolheria fazer em dada circunstância. Esse conhecimento compõe os chamados contrafactuais da liberdade, ou seja, fatos sobre o que qualquer ser com livre-arbítrio faria livremente se estivesse em uma situação específica, permanecendo, assim como o conhecimento natural, independente da vontade divina.
  3. Comando Criativo – Neste “momento”, Deus efetivamente age. Entre o conhecimento das possibilidades e o que se concretiza, há a intervenção e criação intencional de Deus.
  4. Conhecimento Livre – É o conhecimento de Deus sobre o que Ele decidiu criar, abarcando tudo o que “existe de fato”. Esse conhecimento depende totalmente da vontade divina.

Utilizando o conhecimento intermediário, o Molinismo demonstra que todo o conhecimento de Deus é autossuficiente e organizado de forma a permitir o livre-arbítrio do homem. Ou seja, embora o ser humano tenha liberdade plena para suas escolhas, Deus mantém o controle absoluto sobre todos os acontecimentos, sem que essas escolhas sejam impostas de maneira coercitiva.

De acordo com essa visão, Deus sabe, de forma onisciente, como você seria se tivesse vivido na África em vez de na Austrália ou se um acidente de carro tivesse causado sua paralisia aos 9 anos. Ele conhece as transformações que o mundo sofreria se John F. Kennedy não tivesse sido assassinado. Mais importante ainda, Deus sabe quem escolheria a salvação em cada uma dessas circunstâncias distintas.

É a partir desse conhecimento intermediário que Deus escolhe criar. Ele conhece todos os mundos possíveis e opta por criar aquele que melhor se alinha aos Seus propósitos finais. Assim, embora o ser humano seja verdadeiramente livre, Deus exerce controle total sobre quem será, ou não, salvo. Os molinistas divergem, entretanto, quanto à definição dos desejos subjacentes de Deus: alguns acreditam que o objetivo é salvar o maior número de pessoas, enquanto outros defendem que a criação visa maximizar outro propósito divino.

O Molinismo é bíblico?

Os defensores do Molinismo apontam para diversos trechos bíblicos como evidência de que Deus possui esse “conhecimento intermediário”. Por exemplo, em Mateus 11:21–24, Jesus denuncia as cidades de Corazin e Betsaida, afirmando que “se os milagres realizados em vocês tivessem sido realizados em Tiro e Sidom, eles já teriam se arrependido, vestindo-se de saco e cinzas”. Esse tipo de declaração “se-então” é interpretado como uma indicação de que Deus conhece o que ocorreria em diferentes circunstâncias, servindo como evidência para o conceito de conhecimento intermediário.

Do ponto de vista bíblico, o Molinismo não pode ser plenamente comprovado ou refutado, assim como acontece com correntes teológico-filosóficas como o Calvinismo e o Arminianismo. O conceito de conhecimento intermediário é, antes de tudo, uma ideia filosófica que procura sustentar tanto a soberania divina quanto o livre-arbítrio humano, podendo ser analisada por meio de perspectivas bíblicas e filosóficas.

Críticas ao Molinismo provêm tanto de calvinistas quanto de arminianos. Os primeiros argumentam que a ênfase no livre-arbítrio humano compromete a soberania absoluta de Deus, enquanto os segundos afirmam que, se Deus determina quem será salvo ou não, o livre-arbítrio se torna ilusório. Em resposta, os molinistas defendem que a Bíblia revela, de forma equilibrada, tanto a soberania divina quanto a liberdade humana, e que o conceito de conhecimento intermediário permite a coexistência desses dois aspectos.

Embora nem todos vejam o Molinismo como a melhor abordagem para compreender a soberania de Deus e o livre-arbítrio humano, as Escrituras deixam claro que Deus reina soberanamente sobre todas as coisas (Provérbios 16:33; Mateus 10:29; Romanos 11:36; Efésios 1:11), inclusive sobre as decisões humanas (Provérbios 20:24; Provérbios 21:1). Embora Deus não incite o homem ao pecado (Tiago 1:13), Ele opera em tudo—de indivíduos a nações—para realizar a Sua vontade (Isaías 46:10–11). Seus propósitos não dependem da ação humana (Atos 17:24–26), tampouco Deus descobre ou aprende (1 João 3:20; Jó 34:21–22; Salmos 50:11; Provérbios 15:3). Tudo é decretado pelo conselho infinitamente sábio de Deus (Romanos 11:33–36).

É importante destacar que o Molinismo concorda com o que é afirmado nesses textos. As divergências entre calvinistas, arminianos e molinistas surgem principalmente na forma de interpretar doutrinas como a depravação total e a expiação limitada, especialmente à luz das ideias expostas acima.

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