O Livro de Susana (também conhecido como História de Susana e os Anciãos) faz parte do que é considerado os livros Apócrifos/Deuterocanônicos e aparece no Antigo Testamento das Bíblias Católicas. Os livros apócrifos foram, em geral, escritos durante os aproximadamente 400 anos entre a composição dos livros do Antigo e do Novo Testamento, o período intertestamentário. Susana é um dos 12 a 15 livros geralmente reconhecidos como parte dos Apócrifos.
Susana integra as adições ao livro de Daniel (assim como Bel e o Dragão, A Oração de Azarias e o Cântico dos Três Jovens) e foi provavelmente composto entre 200–100 A.C. O Livro de Daniel, escrito pelo próprio profeta Daniel, no século VI A.C., é posicionado em locais diferentes da Bíblia dependendo da cultura: os judeus o incluem entre os Escritos, desconsiderando suas profecias, enquanto as traduções em inglês o colocam entre os Grandes Profetas.
O Livro de Daniel inicia com o desejo do rei Nabucodonosor de impor a cultura babilônica sobre alguns jovens israelitas, entre os quais se destaca Daniel, mas com o passar dos anos Daniel surpreende Nabucodonosor ao interpretar seus sonhos simbólicos. Após uma série de confrontos religiosos, as interpretações de Daniel eram claras: aceitar Deus ou sofrer Sua ira. O rei, então, aceita Deus. Anos após esses eventos, Daniel é chamado a interpretar palavras proféticas para o filho de Nabucodonosor, Belsazar. Belsazar morre e perde o reino para Dario, o Medo. Após ter recebido poder de Dario (e ter sobrevivido a um encontro com leões por intervenção divina), Daniel vivencia uma série de intensas visões pessoais – sonhos que mostram acontecimentos desde um futuro próximo até o fim dos tempos.
O Livro de Susana é colocado, na tradição de Teodósio, antes dos eventos de Daniel 1; entretanto, as edições da Septuaginta e da Vulgata o situam entre Daniel 12 e 14. As influências literárias mais fortes sobre Susana são os livros do Antigo Testamento de Gênesis, Levítico e Deuteronômio, embora, ironicamente, ele não dependa do próprio Daniel. Embora a igreja primitiva tenha considerado sua canonicidade, já no terceiro século surgiram debates – conforme atestado na Carta a Africano – sobre se ele deveria ser excluído.
Estruturalmente, o livro possui apenas 64 versículos e pode ser resumido da seguinte forma:
- Na Babilônia, um homem rico chamado Joacim casa-se com a temora a Deus Susana, filha de um sacerdote.
- Dois anciãos, que se tornaram juízes locais, visitam a casa de Joacim e passam a perseguir Susana, desejando-a e desobedecendo à lei de Deus.
- Após vários dias, enquanto observava Susana se preparando para tomar banho, os anciãos se aproximam e afirmam que, como os portões do jardim estão fechados e ninguém os vê, desejam-na intensamente. Exigem seu consentimento para ter relações com ela, ameaçando acusá-la de ter estado com um jovem se ela se recusar.
- Susana recusa o chantagem e denuncia a tentativa de estupro.
- Ao chamar atenção para as ações dos anciãos, ela é levada a julgamento no dia seguinte. Durante a sessão do tribunal, os anciãos reafirmam sua falsa acusação, afirmando que Susana estava comprometida com um jovem.
- Considerada culpada, Susana é conduzida à execução, até que Deus inspira um jovem chamado Daniel, que, ao retornar o julgamento, declara a mentira dos anciãos.
- Daniel questiona individualmente cada ancião, perguntando: “Sob qual árvore vocês os viram íntimos um do outro?” Como cada um responde de forma diferente, Susana é libertada e os anciãos são executados.
Tanto a observância quanto a violação da Lei de Deus estão no cerne do Livro de Susana. Desde o início, é afirmado que Susana foi educada “de acordo com a lei de Moisés”, o que se evidencia claramente ao longo do texto. Ao ser forçada a escolher entre cometer adultério ou ser falsamente acusada dele – o que levaria à morte – Susana demonstra seu conhecimento da lei, citando passagens que determinam pena de morte para ambos os envolvidos em casos de adultério. Quando ameaçada de estupro, Susana sabe que a Lei ordena que a mulher clame por socorro, para que o ocorrido não passe despercebido. Durante o julgamento, ela acusa os anciãos de terem apresentado testemunho falso, evidenciando sua compreensão da lei conforme os preceitos estabelecidos na Torá.
Os “dois anciãos, dos quais o povo havia designado juízes”, embora conhecedores da Lei de Moisés, optam por desobedecê-la. Movidos pelo desejo por Susana, mesmo tendo a lei que proíbe cobiçar a esposa do próximo, os anciãos, antes de darem falso testemunho, tocam a cabeça dela, desrespeitando os preceitos que determinavam que a inocência deveria ser preservada por meio de testemunhas. Ironia do destino, ao serem expostos como mentirosos e desdenhosos da lei divina, os próprios preceitos se voltam contra eles, decretando seu fim.
Outro ponto de destaque no Livro de Susana é a intervenção divina, um tema importante em toda a tradição bíblica. Se Deus não tivesse “inspirado o espírito santo em um jovem chamado Daniel”, está certo que Susana teria sido injustamente executada. A atuação de Deus por meio de um instrumento humano é um dos temas recorrentes no Antigo e no Novo Testamento. Sempre que a humanidade se desvia ou viola as leis divinas, é frequente a intervenção de Deus para corrigir a injustiça ou, quando necessário, fazer cumprir Sua vontade de forma justa.
O Livro de Susana, embora breve, é uma narrativa poderosa sobre a inocência e a corrupção da Lei de Deus pelo homem. Mesmo não sendo considerado canônico por muitos, sua história contém mensagens relevantes para o judaísmo e o cristianismo contemporâneos. Ao explorar suas principais ideias religiosas e o pensamento judaico da época em que foi escrito, o leitor pode compreender melhor as virtudes e limitações da aplicação humana da Lei divina, reafirmando que, independentemente das circunstâncias, Deus assegurará que a justiça prevaleça.






